O jornalismo, por princípio, deve ser imparcial. No entanto, essa imparcialidade não significa a esterilização do jornalismo ou mesmo a retirada do debate público de motivações políticas, mas sim o compromisso com a diversidade e o equilíbrio dos pontos de vista dentro da matéria.
O jornalismo tem como material de trabalho a língua, meio pelo qual se notícia algo, um fato. As imagens também compõem o jornalismo, mas a "tradução" dessa imagem, quando necessário, se dá pelo uso das palavras
O grande dilema da imparcialidade do jornalismo está no fato da própria língua ser um 'agente' político. O semioticista francês Roland Barthes asseverava o carácter fascista da língua, segundo ele, ser facista "não era deixar de dizer, mas obrigar a dizer".
Dito de uma outra forma, Barthes afirmava que falar de uma política da língua abriu naturalmente espaço para falar de uma política do sentido (significados) que a língua constrói.
Essa consideração me parece pertinente ao falar do jornalismo quando ele se pretende imparcial. Nunca o foi e nunca o será. A começar pelo fato de que há uma "escolha" de uma pauta – e uma escolha – é um ato político.
O modo como um assunto é tratado na matéria também é uma escolha
Da maneira como um fato é narrado é possível se chegar numa outra conclusão se fizesse um percurso semiológico diferente.
Analisemos uma manchete fictícia:
“JUIZ AUTORIZA LOCKDOWN NO FIM DE SEMANA EM COXIM E GARANTE A NÃO CIRCULAÇÃO DO CORONA VÍRUS”
À primeira vista parece uma simples manchete, mas se analisarmos o percurso do sentido que a frase perfaz chegamos à conclusão de que ela foi intencionalmente articulada para produzir um significado positivo: de que a ‘ação do juiz’ é uma garantia da não infestação da covid-19.
Uma vez construída a ideia de que o fato noticiado é algo positivo, as considerações e opiniões em contrário, logo são negativas, de imediato.
Notícias ou matérias com essa configuração não está tão somente reportando um fato, está também se posicionando a respeito desse fato.
Uma vez assumida uma posição pode-se dizer adeus à imparcialidade